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.:.CONTOS DE TERROR.:.
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CONTO 1 = 

Por quê você não pode falar com os mortos

PUBLICAÇÃO FEITA DIA = 26/05/2015

A minha tia era uma vigarista e ela aprendeu com o melhor - o pai dela. O meu avô nunca fez algo muito grande, porém ele viveu trapaceando, se mantendo discreto, fora do radar, o que provavelmente fez com que ele nunca fosse pego. Nenhuma vez. Ele se orgulhava muito disso.
Mamãe não entrou no “negócio” da família. Em vez disso ela encontrou uma religião e se casou com um contador. É tão irônico, é como uma piada, porém é verdade; O papai era o melhor em me ajudar com as lições de casa de Matemática. Mamãe cuidou de mim para que eu não tivesse uma infância corrompida, e pudesse seguir um caminho mais interessante na vida.
Tia Cassie era a única pessoa que poderia mexer no caminho da minha vida. Ela era uma psicóloga, o que a fazia um pouco mais respeitável. Mas a tia Cassie usava sua habilidade para “ler” uma pessoa de várias maneiras possíveis, uma, provavelmente não foi esperada pela Universidade que emitiu o seu diploma.
Tia Cassie era uma verdadeira psíquica.
Ela teve uma loja e tudo, vendia cristais, ervas, velas. Tudo que você precisar para preencher o vazio místico da sua vida poderia ser comprado na sua pequena loja. Também havia uma sala privada nos fundos, a qual ela usava para leituras espirituais e sessões espíritas.
Por que ambos os meus pais trabalhavam, eu era deixado na loja da tia Cassie para ajudá-la com os seus pequenos shows. Eu a ajudava com tudo, desde mexer nas luzes, até bater nas paredes. Brincar com o termostato foi ideia minha, e foi uma muito efetiva. Os clientes chegavam a sentir arrepios em suas espinhas não é mesmo? Por quê não oferecer isto?
Cassie me ajudou a me tornar o cético que eu sou hoje. Me mostrou tudo por trás das cenas, truques e etc… Nós assistíamos talk shows com mágicos e médiuns e Cassie me explicava cada passo desde uma simples previsão até como impressionar uma audiência inteira.

Depois de um episódio realmente convincente, eu perguntei para ela se aquilo não poderia ser real? E ela respondeu:
“Os mortos não falam. Qualquer um que afirmar o contrário está fumando maconha até pela bunda.”
Era a convicção dela, mais que tudo, que me fez acreditar nela.
Só houve um cliente que eu já vi a minha tia recusar. Ele era velho, careca e corcunda. Ele tirou o seu chapéu, entrou na loja, e ele torcia o chapéu a medida que ele falava. Cassie ficou tensa imediatamente quando o viu.
O homem disse que trabalhou no sistema penitenciário. Corredor da morte. Ele foi responsável por executar alguns dos maiores criminosos do planeta. Em sua idade avançada, isso o atormentava, devorava sua alma. Ele queria que a Cassie entrasse em contato com as almas daqueles que ele matou, para que ele pudesse se desculpar e implorar por perdão antes de se juntar a eles.

Minha tia ficou em choque. Eu nunca a vi tão nervosa! Ela jogava coisas nele e gritava: “SAIA SAIA SAIA CALA A BOCA SAI FORA!”
Eu me escondi debaixo do balcão com as mãos sobre meus ouvidos até ele ir embora. Depois eu pensei que a reação dela, foi o medo devido a profissão daquele homem. Um executor deve ser o pior pesadelo de um vigarista.
Eventualmente eu descobri isso. Eu queria fazer um show para os meus pais e estupidamente eu tive a brilhante ideia de me passar por um médium, onde eu fingiria falar com o meu avô para a minha mãe, desde que ela sentia muita falta dele. Grande erro. Mamãe enlouqueceu e me proibiu de ver a tia Cassie de novo.
Eu deixei alguns livros na loja, então eu corri para pegá-los enquanto a minha mãe fumava no carro lá fora. Tia Cassie nem precisou perguntar o que havia de errado. Ela podia ver no meu rosto. Eu dei um abraço nela e um adeus enquanto chorava, mas ela me contou um último segredo antes de eu ir.
“Garoto, tem uma maldição nesta família que é passada como uma tocha. Eu espero que os deuses te protejam, e que não seja passado para você quando eu morrer”
Nós não nos falamos novamente por 9 anos. Isso foi quando o Facebook chegou e nenhuma proibição dos pais poderia me evitar de tentar me reconectar com ela. Foi estranho. Ela estava com dificuldades na vida; foi diagnosticada com um transtorno de esquizóide que acabou com os seus negócios.
Para pagar suas contas, ela teve que trabalhar legitimamente e com isso ela foi perdendo todo o seu entusiasmo e paixão pela vida
Um dia eu cheguei em casa e vi uma mensagem esperando na minha inbox, que fez o meu estômago embrulhar.
“Eu te amo garoto. Lembre-se do que eu disse para você.”
Eu disquei o número dela, já chorando. Ninguém atendia. Não parava de ligar de novo e de novo, várias e várias vezes…
Eu estava muito atrapalhado e não consegui contar para a minha mãe. A polícia fez isso por mim no dia seguinte.
Acidente de carro. Motorista bêbado.
O funeral foi um borrão para mim.Eu sentei entre os meus pais na primeira fila e eu estava transtornado, tentando me lembrar do que a minha tia queria que eu me lembrasse.
Nós seguimos o carro fúnebre até o cemitério em silêncio. O padre disse algumas palavras e então eu fui deixado sozinho perto da sua lápide, e eu continuava tentando lembrar.
Eu ouvi trechos da conversa dos meus pais:
“Se Cassie não tivesse sido tão oculta…”
“-Esperando uma pequena participação. É uma vergonha.”
Pequena participação? Aquilo me incomodou. As caixas com coisas do serviços iam até o teto. Eu me virei para dizer algo e eu finalmente entendi.
Atrás dos meus pais haviam várias pessoas, todas paradas encarando o morto a sua frente. Meus pais não estavam dando para eles a menor atenção. O padre murmurou algumas condolências e desculpou-se indo embora pela direita, sem perturbar uma única pessoa.
À frente do grupo, todos olhando exatamente como eu olhei quando vi Cassie pela última vez. Todos os sentimentos e condolências do mundo, não fizeram nenhum bem. A boca dela estava bem aberta, realmente muito aberta e finalmente eu entendi. Eu descobri qual é a maldição da família. Eu sei porque os mortos não falam.
Eles estão muito ocupados gritando. 



Tradução Rafa Matos
CONTO 2 =

PELA ESCADA

PUBLICAÇÃO FEITA DIA = 26/05/2015



Não que estivesse atrasado, porém se esperasse por mais alguns minutos certamente ficaria. 
Ajeitou a mochila sobre o ombro e apertou novamente o botão do elevador mas, por mais que ouvisse os cabos se movendo e o motor funcionando, nunca chegava até o seu andar. 
Eram apenas três andares. Preferiu usar as escadas. 
Abriu a porta do corredor que conduzia ao primeiro lance e o sensor de movimento imediatamente acendeu a luz, revelando o caminho até uma porta no lado oposto, que dava na outra metade do andar.
Hesitou por alguns momentos, de ouvido em pé, para ver se o elevador já estava chegando. Apenas o som do motor continuou ecoando pelo fosso que atravessava os andares, mas nem sinal dele chegar.
Então entrou e fechou a porta atrás de si, bem no momento que ouviu um "clique" e o sensor apagou a luz. O tempo de espera não era muito longo.
A escuridão caiu maciça à sua volta, negra e quase sufocante. Um indício de claustrofobia o fez agitar os braços ansiosamente, se sentindo um idiota assim que a luz tornou a acender. 
Achou melhor se apressar. Se a luz do andar acima apagasse antes que chegasse no perímetro do sensor abaixo, poderia acabar rolando alguns degraus com aquela escuridão tão intensa.
Cada andar era separado por três lances de seis a sete degraus, virando sempre à direita. Desceu o primeiro e deu de cara com a escuridão do segundo andar invadindo o segundo lance de escada. Sentiu um leve arrepio e começou a descer mais rápido, preocupado com a hora que a luz acima apagasse. 
A luz abaixo levou um segundo a mais para acender, quando atingiu o último degrau do terceiro lance. No instante seguinte ouviu o "clique" da luz acima se apagando.
"Melhor descer um pouco mais rápido", pensou. Como da outra vez o lance do meio estava escuro até a metade. Acelerou o passo, começando a ficar mais nervoso do que imaginou que ficaria.
Curiosamente, dessa vez a luz superior apagou antes que terminasse o terceiro lance e a escuridão o envolveu por dois segundos.
Nesses dois segundos sentiu algo que o apavorou: algo o espreitava através da escuridão. Podia sentir e quase ouvia sua respiração. A luz superior continuava apagada.
A luz do andar que estava acendeu. Não havia ninguém.
Agora começou a descer as escadas correndo, sentindo um suor frio escorrer pela suas costas. Não fazia sentido algum, mas quanto mais rápido ia, mais rápido as luzes apagavam e mais tempo demoravam a acender.
Já não fazia ideia de em qual andar se encontrava, nem quantos lances ainda haveria de descer, mas a presença que o perseguia era uma certeza constante e cada vez mais próxima. Ouvia passos, mas não conseguia identificar se eram os seus que ecoavam escada acima.
Tropeçou e deixou a mochila cair. Ouviu o "clique" da luz superior apagando e nada da próxima luz acender. Abaixou-se e tateou o chão atrás da mochila, notando que por mais ruidosa que sua respiração estivesse, não encobria o pavor de sentir que algo se aproximava inexorável e lentamente pelas suas costas, como se tivesse a certeza de que o alcançaria por mais que corresse. 
A luz acendeu e viu o "T" pintado na parede. Finalmente o térreo. Pegou a mochila a tempo de sentir um leve movimento cálido em sua nuca.
Correu em direção à porta de saída sem coragem de checar se tinha mesmo alguém atrás de si e quanto mais corria, mais longe a porta ficava. Desesperou-se. Algo escorreu pelo seu rosto. Poderia ser suor ou lágrimas, mas não lembrava de ter começado a chorar. Faltava pouco e estendeu a mão para segurar a maçaneta. Um último impulso e soltou um gemido que foi quase um grito de terror. Se demorasse mais um segundo para alcançar a maçaneta a luz poderia…
"Clique."



Conto do Pedro Texas
CONTO 3 =

A verdade sobre os suicídios na UERJ

PUBLICAÇÃO FEITA DIA = 26/05/2015

Quem é do RJ ou já estudou na UERJ conhece as histórias de suicídios que tem por lá... Esse tipo de notícia nunca é divulgada para não incentivar outros suicídas. Mas pq tantos suicídios no mesmo lugar?



Olá, estou trazendo aqui um texto de um amigo meu, um estudante de jornalismo da UERJ, Alessandro Carvalho. Faço direito lá, onde o conheci, e encontrei essas páginas aqui transcritas em sua mochila. Ele está morto agora. Foi encontrado há duas semanas com o crânio esmagado por uma pedra no estacionamento atrás do prédio de química. Não sei o quanto disso é real, mas acho que deveria ser conhecido. 

“Muitas pessoas conhecem o prédio principal da UERJ na rua São Francisco Xavier como o centro de suicídios do Rio de Janeiro. Se você quer se matar, a UERJ é seu destino. O prédio serve como um imã de sacrifícios humanos para a cidade. Você chega lá, pega um dos elevadores, torce para que ele chegue até em cima sem partir no caminho, sai, se desloca até um dos vãos abertos e se joga. Talvez acerte alguém no final, talvez acerte um carro, mas geralmente só o chão de concreto sofre com o impacto do seu crânio se espatifando contra ele. Geralmente são reportados de dez a quinze suicídios na UERJ por ano, e isso por boca-a-boca, pois nenhuma notícia jamais sai em algum jornal. É claro que esse é só o número dos que tem testemunhas, o verdadeiro número é muito maior, de trinta a quarenta pessoas se jogam de lá por ano, mas para saber disso você tem de ir por outras vias. Acredito que quando entrei na UERJ para cursar jornalismo no décimo andar, nem dos suicídios eu sabia. Agora, depois de ter tomado na oficina de reportagem do quinto período aquela estúpida decisão de estudar esses casos, temo ter aberto uma porta, que caso não custe só a minha sanidade, também possa levar a minha vida. 

Algumas coisas às vezes só se mantêm escondidas porque ninguém está interessado em revirá-las. Porém, o que aquele idiota que toma coragem de revirá-las não sabe, é que depois que se faz, não há volta, e que se entrou num caminho a que cada nova descoberta leva só a mais novas perguntas, perguntas a lentamente tragar para o abismo. O número secreto de verdadeiros suicídios no prédio não era nem a ponta do iceberg. Quem é da UERJ também sabe das outras histórias, da má fama que as escadas que correm por cada corredor por trás de pesadas portas de metal tem. Alguns só ouviram de assaltos, outros de estupros, os mais curiosos talvez dos assassinatos. Quem conhece os funcionários do lugar, os faxineiros e os seguranças, talvez também tenha ouvido da má fama do turno da noite. É raro o segurança novato que após uma noite na UERJ não peça demissão no dia seguinte sem dar explicação alguma. E os que se mantêm nunca são os mesmos, são fechados, se isolam do resto, como se tivessem perdido sua humanidade. Isso é claro sem contar no próprio estado natural dos serventes do local, se você presta atenção o suficiente neles, logo notará que é uma coleção dos indivíduos mais peculiares, de aparências estranhas, de deformidades escondidas por trás de seus uniformes cinzas. Até esse ponto, tudo que chegava a mim era tolerável, até mesmo a suposta existência de cinco andares negativos no subterrâneo do prédio, porém isso tudo mudou quando comecei a coletar os relatos sobre a criatura. Mas não posso continuar sem antes falar do Professor Silvana. 

Carlos Silvana foi um respeitado professor de história da UERJ, um doutor especialista na história do Rio de Janeiro, que também cometeu o erro de tomar para si o estudo do prédio e do local em que foi construído. Seus papéis nunca foram publicados, e até minhas mãos os tocarem, se mantiveram escondidos em partes abandonadas de uma biblioteca da UERJ. No verão de 1994, depois do que muitos descrevem como um comportamento paranóico, outros de quase insano, ele sumiu deste planeta sem deixar nenhum traço. Foram graças a seus estudos que descobri grande parte da história daquela parte da cidade em que foi construída a UERJ. Silvana conseguiu reunir relatos tão distantes quanto a vinda dos franceses e portugueses para essa terra. Especificamente nos papéis do padre jesuíta Augusti Sabatino, que pregou no engenho jesuíta ao qual o terreno da UERJ um dia foi parte. Sabatino relatou em muitos dos seus escritos as histórias dos índios sobre o lugar, além de sua própria experiência. E aqui vou tentar resumir o que esses dois homens conseguiram agregar sobre o lugar. 

Os índios que um dia habitaram essa terra, antes de com a chegada dos europeus, terem mudado de nome, se integrado e esquecido de sua cultura, comiam seus mortos. Não havia nada mais prazeroso do que comer alguém bravo com uma vida honrosa e digna, tanto de sua própria tribo, como um inimigo vencido de outra. Porém havia aqueles mortos indigestos, que quando vivos eram dados como párias pelos outros índios: criminosos, insanos, ou até xamãs que praticavam certas artes vista como proibidas e erradas pelos outros xamãs. Esses mortos, ninguém queria comer, ou sequer olhar, e assim eles eram enterrados. Porém, como esses lugares de enterro eram vistos como tomados pelo mal, pelos maus espíritos daqueles que os habitavam, geralmente eram cemitérios separados de tudo e de todos, em que geralmente as tribos se davam ao trabalho de fazer viagens de muitos dias e noites para se livrar daqueles corpos vistos como indignos. E um dos maiores cemitérios desse tipo tomava um terreno que hoje em dia está tomado pelo prédio da UERJ e por parte do Maracanã. Um local proibido cuja história foi ignorada pelos jesuítas que lá foram montar seu engenho. Decisão que iria lhes custar caro, quando chegaram aqui em 1579. Rapidamente, o terreno que foi dedicado a uma extensa plantação de jaqueiras foi tomado por rumores da população de índios recém convertida, como pertencente ao demônio. Rumores confirmados pelos próprios missionários quando os suicídios de alguns dos seus membros começaram. Primeiro os suicídios, depois a loucura. Foi ao redor da década de 1620 quando um missionário louco tacou fogo na plantação. A reação dos jesuítas foi construir uma igreja no lugar em que hoje em dia se encontra o pavilhão João Lira Filho da UERJ. E é nele que encontramos Sabatino pregando em 1683. Um ingênuo jesuíta que segundo o próprio relato foi despido de tudo menos sua fé na luta em que teve com o demônio dentro daquele prédio naquele ano. Luta que lhe deixou com metade do corpo queimado, além da igreja abandonada em ruínas. A mata eventualmente tomou o lugar, já que ninguém mais se atrevia chegar lá. E assim foi até a expulsão dos jesuítas. 

O que era regra, virou lenda, e o que era lenda, virou rumor do povo. E ninguém da boa sociedade vai dar ouvidos ao rumor do povo. Assim, em 1856 foi inaugurado naquele mesmo terreno, pelo nosso primeiro grande pseudo-intelectual almofadinha, D. Pedro II, o Sanatório de São Francisco. O primeiro grande estabelecimento dessa categoria na America Latina, para receber seus pobres doentes mentais, como a própria prima do imperador, D. Rosa, a insana. O que resta de arquivos daquele respeitado estabelecimento, conhecido por afogar seus ocupantes no gelo, além de outras práticas de tortura, foi perdido no incêndio que tomou de vez o hospital público que havia se transformado com a proclamação da República. As ruínas desse hospital iriam eventualmente se tornar a Favela do Esquelo. 

Notória por sua bandidagem, como o famoso Cara-de-Cavalo, na favela do Esqueleto é que encontraria as primeiras referências diretas a criatura. Muitos dizem que a razão de Vargas para escolher aquele lugar para a faculdade fora seu conhecimento sobre a criatura. Claro, que outros apontam para outras razões mais sinistras, como a necessidade para o próprio banho de sangue que foi remover a população local, que ainda irei de tratar. É desse período que Silvana encontra em um dos relatos de um de seus poucos sobreviventes, um que foi realmente “relocado” para a favela de Nova Holanda, atual Maré, descrições sobre a criatura. O Senhor X, como Silvana o chamava, diz que” 

É isso, o resto da página está rasgado. Não sei que fim teve o caderno cujas essas páginas pertenciam. Não sei se devo realmente acreditar em tudo que li. Só sei que precisava dividir com o mundo essas palavras de meu amigo. 



Texto original do Daniel Matos, retirado do blog https://www.danielmatos.com.br/
CONTO 4 = 

Saia do Meu Quarto

PUBLICAÇÃO FEITA DIA = 26/05/2015

  

Rua M, 58

Sinopse: Bernardo e Cíntia, um casal morador de Vitória, no Espírito Santo, para Domingos Martins, interior do estado, para visitar uma casa, herança do pai de Cíntia. No caminho eles encontram um bar, onde as pessoas narram histórias trágicas ocorridas naquela casa, a fim de fazer o casal mudar de ideia. 

Capítulo 5
SAIA DO MEU QUARTO

– Ei, você – aponta Teodoro para um senhor sentado próximo ao balcão – não é você que conhece a história daquela família que se mudou para há dois anos?
O homem não se mexe. Parece não querer muita conversa. Continua tomando uma cerveja com um pesar de quem não queria estar ali.
– Ah, vamos lá, rapaz! Não vai doer se você contar o que sabe daquele casarão maldito!
– Deixa ele, cara, – Bernardo tenta quebrar o longo e constrangedor silêncio entre os pedidos de Teodoro – deve ser nada interessante.
A insistência de Teodoro ou o pouco caso de Bernardo convence o rapaz:
– O que eu tenho a falar não é interessante, pois ninguém com o mínimo de compaixão pode achar que o desmantelamento de uma família é uma boa história.
Os olhares de Bernardo e Cíntia os provava do contrário. E então ele resolveu contar.

***

Há cerca de dois anos, uma família que vivia naquela casa foi desfeita de forma misteriosa. Uma família perfeita. Pai, mãe e uma filha. Os rostos felizes de Leonardo, sua mulher Melissa e a pequena Carol ainda estavam emoldurados, eternizados no porta-retrato em cima da mesa de trabalho de Melissa.
A mulher que contemplava a foto da família era uma cópia desfigurada pelo choro e pela perda. O contraste era aparente e a taça de vinho ao lado da garrafa quase vazia era necessária para superar e seguir em frente. O período de luto devia passar, ela ainda tinha ainda que uma rocha para quem ficou.
Mas Melissa parecia quer morrido para o mundo. Ignorava tudo e todos, telefonemas e e-mails de parentes e de colegas de trabalhos. Até para as pessoas mais próximas.
– Mãe – disse Carol, chegando sorrateiramente.
Melissa ignorou a filha, de rosto angelical abraçada a um grande urso. Mas a menina insistiu: – Mãe... O papai está lá no meu quarto de novo!
Carol não tinha mais que sete anos, filha única, única sobrinha, única neta... Mimada por todos os lados. Tinha seus desejos atendidos da primeira vez que pedia algo. Mas o estado da sua mãe naqueles dias não a deixava contente.
A menina apertava o urso, descontando toda a frustração de não ser atendida pela querida mãe. Talvez ela tivesse um pouco de medo também, já que o pai dela estava em seu quarto, seu refúgio, seu pequeno castelo cor de rosa. Carol levou o polegar na boca, mastigando o dedo, esperando alguma reação de sua mãe, que soluçava copiosamente.
Ao ver que o quadro não mudaria, Carol bateu o pé, jogando seu urso no chão.
– Mãe, manda o papai sair do meu quarto! Eu quero dormir e ele está lá! Eu quero que ele saia do meu quarto agora!
Melissa se recompôs enxugando os olhos, colocando a foto de pé de volta na mesa de trabalho.
– Desculpa, filhinha. Eu não devia estar chorando assim.
– Tudo bem! Agora dá pra pedir o papai para sair do meu quarto?
Ela ainda acariciou a imagem da família feliz mais uma vez, antes de levantar se escorando nas paredes.
Quando viu Melissa sair pela porta da sala que dá acesso ao corredor, Carol pediu mais um capricho:
– Mãe, faz um chocolate para mim?
Carol, essa menina sempre conseguiu tudo mesmo! Estava lá a Melissa indo para a cozinha fazer o chocolate!
Melissa misturou o chocolate no copo de vidro, fazendo um barulho hipnótico para Carol, que observava com atenção o que a mãe fazia.
Mas o som intermitente feito por Melissa disputou espaço na casa com um gemido gutural. Melissa olhou para o corredor que dava acesso a sala e quartos com espanto. Carol apontou para a mãe com olhos arregalados e preocupados.
– Eu falei que papai tava no meu quarto.
Melissa andou cautelosamente pelo corredor mal iluminado com o copo chocolate nas mãos, seguida por Carol, acompanhada pelo urso que ela arrastava pelo pé, como uma medrosa fila indiana. Os calcanhares descalços de Melissa faziam o contato com o piso do corredor um som seco. Se houvesse um vizinho embaixo da casa, ao invés de um escuro porão, fechado há anos, ele já teria reclamado com a imobiliária.
– Não se preocupa, mãe! É o papai que está no meu quarto. O problema é que ele está daquele jeito de novo e só você consegue tirar ele de lá.
Melissa olhou para trás, assustada. Ela procurou um interruptor, mas percebe que a luz está queimada. Ela já falou tanto para Leonardo trocar a lâmpada, mas nas atuais condições era impossível para ele.
Carol acompanhou a mãe de perto o bastante para vê-la se aproximar da porta do quarto, encostar a cabeça na porta, como se tomasse coragem para enfrentar quem ali se encontrava. Melissa tocou na maçaneta gelada, que transfere todo o seu frio para a espinha da mãe apavorada com a situação que terá que enfrentar. Uma vez a mão na maçaneta, ela respirou fundo e a torceu.
Melissa abriu vagarosamente a porta, temendo o que encontraria por lá. Na medida em que a porta abria um pouco de luminosidade vinda de fora do quarto que escapava para o corredor sem luz, contribuindo para um clima fantasmagórico.
O gemido era facilmente ouvido e reconhecido: Leonardo mesclado às sombras, provocadas pela cortina. Quarto apagado, luz distante do poste da rua, silêncio interrompido ora pelo fungar de um homem perdido ou de um cão latindo na rua.
– Leonardo?
A figura sentada na cama de Carol parecia chorar a décadas. Lágrimas, saliva e urina tomavam o chão. Ele não saia daquele quarto, cada vez mais consumido pela aura do local. Melissa olhava pálida a figura do marido naquele ambiente cheirando a morte.
Ela engoliu a seco e ensaiou um pouco de autoridade.
– Leonardo, saia daí.
– Eu não consigo deixar este lugar, Melissa.
Melissa se aproximou com cuidado. Ela se perguntava se aquela poça formada no chão era real. Mantendo uma distância segura do imprevisível Leonardo. Ela respirou fundo uma, duas vezes. Sua respiração virou quase um soluço descontrolado. Melissa precisava retomar o controle, precisava dizer as palavras certas.
– Mas é preciso, amor. Não tem nada aqui pra você, nem pra mim!
– Até parece que você não se importa! – disse Leonardo de olhos serrados, aumentando a quantidade de lágrimas escorrendo pelo rosto.
Carol não se atreveu a entrar no quarto, encostada na parede ao lado da porta, abraçada com o urso escutando a mãe falar. Melissa, alterada, falou alto, mostrando quem manda ali. Carol se contraiu, pegando as mãos do urso de pelúcia e colocando em seus ouvidos, na esperança de abafar a briga.
Dentro do quarto, Leonardo pareceu ter entendido Melissa. Ele olhou para um urso na cabeceira da cama de Carol, curiosamente parecido com o que a filhinha carregava. Leonardo parecia ignorar o que Melissa diz, se esforçando para conter as lágrimas.
– Não é justo você dizer isso. Eu estou apenas tentando seguir em frente e preciso que você faça o mesmo.
Leonardo olhou para a sua esposa e fez menção a tocar no urso. – Posso?
Melissa consentiu com a cabeça, quase chorando. Leonardo estendeu a mão para pegar o urso na cama. Suas mãos chegaram a ele com uma leveza e graça que parece atravessá-lo. 
– Nãããão! Isso está errado! – gritou Carol, do corredor.
Leonardo e Melissa saíram do quarto, passando do lado da menina de olhos vermelhos, que abria as suas mãos em forma de garras, intencionada a acertar alguém.
Leonardo levou do quarto o urso, o abraçando fortemente, enquanto a menina os amaldiçoava com todo o ódio de uma garota mimada que não tinha mais os seus desejos atendidos.
– Eu ainda consigo ver ela abraçada com esse urso. – dizia Leonardo, tentando conter os soluços de seu choro.
– Ela adorava esse urso. Chamava ele de Gimbo, eu acho. Agora, toma seu chocolate.
Carol parou de gritar, ao ver que nunca seria ouvida, voltou para o seu quarto, o lugar onde passou os momentos felizes de sua vida.
Ao andar batendo os pés com raiva, ela fez algo rotineiro de quando ela era contrariada: bater a porta com força.
O som extremamente familiar despertou em Leonardo e Melissa a certeza de que não estavam sozinhos naquela casa.

– Nossa – se espanta Bernardo – e o que aconteceu com a menina?
O homem olha para o copo, como se não se importasse com a história que contara.
– Vagou pela casa tentando ter seus desejos atendidos. Talvez já tenha tomado coragem e seguiu em frente, mas a sua morte prematura pode dificultar muito a pessoa deixar os vivos... viverem. – Conclui o senhor, que ainda carrega a mesma obscuridade no olhar.




Autor: Estevão Ribeiro 
Esse conto deu origem ao curta "Saia do Meu Quarto"